terça-feira, 5 de maio de 2015

INCRÉDULO / DUELO DE SOMBRAS * Antonio Cabral Filho - Rj

DUELO DE SOMBRAS
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INCRÉDULO

Sem otimismo para saudar os que chegam
meu gesto sai brusco minha voz rouca
e meu ser sem ambições acila
ante as notícias que leio
nas entrelinhas das minhas mãos
Enquanto vivo
quero apenas a terra sob meus pés
oxigênio em meu corpo e à minha volta
amor e um pouco de conforto
Afinal me viciaram nisso
Mas depois de cumprida a missão
adeus terra adeus luar adeus amigos
adeus mulheres que eu quis amar
quero dormir imune ao turbilhão

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segunda-feira, 4 de maio de 2015

ODE AO VERSO LIVRE / DUELO DE SOMBRAS * Antonio Cabral Filho - Rj

DUELO DE SOMBRAS
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ODE AO VERSO LIVRE

No princípio a poesia era uma canção regada a vinho
ao som de harpas tocadas com carinhos e beijos de mulher amada
à sombra de palmeiras frondosas
onde o poeta se deleitava com a vida sem fronteiras 
e ela brincava solta pelos bosques entre os duendes
indiferente ao tempo acariciando a sua nudez
coberta de inocência

Depois veio a escrita e de palavra em palavra
foi vergando-a sob o rigor do verso
moldando-a à disciplina da métrica
e aprisionando-a à liberdade
que lhe permite esta margem de papel
E agora ela atravessa as grades das gramáticas
sobrevoa o muro das linguagens
e vem sondar-me
no ondular dos cabelos desta mulher que passa

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domingo, 3 de maio de 2015

LADY MARIA / DUELO DE SOMBRAS * Antonio Cabral Filho - Rj

DUELO DE SOMBRAS
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LADY MARIA

Há uma prostituta faminta
caminhando pelas ruas da cidade
convidando os suicidas
a aparecerem mortos em leitos de hotéis
com as gargantas abertas a navalha

Há uma prostituta bonita e sadia
sentada ao meu lado no ônibus
a caminho de uma boate
me interceptando envolvente
pedindo um cigarro

Há uma prostituta perdida na vida
sendo devorada pela tuberculose
Há uma prostituta escondida
no dinheiro de um milionário
Há uma prostituta dormindo
na calçada de minha rua

Há uma prostituta no bar da esquina
bebendo às copadas sua homérica miséria
Há uma prostituta com disfarce de senhora
circulando nervosa no seio da sociedade

Há uma prostituta em cada um de nós
nos servindo em migalhas aos mercadores
tentando ignorar a própria ruina
em que estamos envolvidos

Há uma prostituta me olhando sorrateira
dos olhos do caro leitor
vendo que eu também sou uma prostituta
que age em função do momento

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